Em seu livro "A Natureza do Serviço Social" (2009), do capítulo 1 - 1.4, o autor Carlos Montaño explora o caráter de subalternidade do Serviço Social, vinculando-o à alguns aspectos como a questão do gênero, o empobrecimento do estudante/profissional, a condição de funcionário público e a conceituação do Serviço Social como tecnologia e sua relação com as “ciências sociais”.
Neste post, vou fazer algumas reflexões especificamente sobre a questão de gênero no Serviço Social, pois foi a parte que mais me chamou a atenção e esclareceu muito sobre o estereótipo que a profissão carrega.
Antes de iniciar, é importante ressaltar que o autor Carlos Montaño está envolvido em processo judicial culpado por violência doméstica do tipo física contra sua ex-companheira, revelando que suas práticas se mostram extremamente descoladas de suas contribuições teóricas e evidenciando que seu compromisso com os valores ético-políticos é completamente nulo ou distorcido. Como mulher e estudante de Serviço Social comprometida com a luta por uma sociedade livre de opressões de gênero, raça e classe, repudio em totalidade as ações do autor.
Para entender a questão do gênero no Serviço Social é necessário retomar alguns aspectos relacionados ao seu surgimento na década de 30: o Serviço Social em sua gênese possui viés religioso e ligação profunda com a Igreja Católica, trabalhando com uma perspectiva moral, conservadora, dogmática e assistencialista. No período de tecnificação do Serviço Social, a Igreja passou a oferecer formação para moças de famílias tradicionais e cristãs com o intuito de exercer “ações sociais”, neste caso, essas ações sociais se traduzem em caridade e assistencialismo. Esse papel de auxiliar -muito presente na gênese da profissão- e não de fato produzir e tomar decisões, é também o papel atribuído à mulheres em sociedades patriarcais e o Serviço Social é identificado em concordância com esse papel, o que até hoje estereotipa a profissão, além de ser, estruturalmente, um dos motivos para que esta seja eminentemente feminina. De acordo com Montaño, o Serviço Social como profissão eminentemente feminina inserido em uma sociedade patriarcal e machista, caracteriza um elemento de subalternidade: “O fato de a mulher ser ‘executiva do assistencialismo’, ligado a ‘um estatuto subalterno de mulher, a um estatuto verdadeiramente de dominação’ desta sociedade, já que ‘na nossa cultura, o assistencialismo é predominantemente feminino’, está vinculado e reproduz o ‘substrato assistencialista da profissão’.” (MONTAÑO, 2009, p. 99). Em um período de luta dos movimentos feministas pela inserção da mulher no mercado de trabalho, o Serviço Social foi um espaço de inserção social e ocupacional para as mulheres. Apesar disso, não foi o suficiente para colocar a mulher em posição de igualdade, afinal, a profissão é vista como feminina e subalterna a profissões ditas “masculinas”, além disso, para o capital, a inserção destas mulheres no mercado de trabalho significou mão-de-obra mais barata, ou seja, seus salários eram inferiores aos dos homens, caracterizando mais uma desigualdade de gênero.
Essa ligação com a gênese da profissão e a questão do gênero, vinculada ao papel que as sociedades patriarcais atribuem às mulheres, é o que originou o estereótipo de que o Serviço Social é uma profissão “auxiliar de outras”. Sendo o principal motivo para que a profissão não seja devidamente reconhecida, afetando, precarizando e diminuindo os próprios assistentes sociais, que por vezes, se veem apenas como uma ponte entre o usuário e os profissionais que são “de fato importantes e que de fato irão realizar mudanças”.
Entendendo a gênese da profissão e a questão de gênero atrelada a ela, podemos ter uma noção do porquê a profissão ainda é tão menosprezada, afinal estamos inseridos em uma sociedade estruturalmente machista e patriarcal. Lutamos como mulheres e lutaremos como assistentes sociais, para atingir as raízes desse machismo que é um problema estrutural grave que afeta profundamente nossas vidas.
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